Forasteiros debaixo de holofotes

 



Esta tertúlia foi adiada tantas vezes, por inúmeros motivos e percalços, que já quase não nos lembrávamos do livro do mês de março, "A Forasteira", da autora Olga Merino. Estivemos a recordar e a puxar pela memória, o que nos levou invariavelmente a conversas labirínticas sobre forasteiros vindos para as aldeias da Serra da Lousã há algumas décadas, o que na altura configurava quase como loucura e enchia a população de perguntas e receios. O que levaria alemães e outros a ir viver para o meio do nada? O que agora é visto como turismo de bom gosto e ganha orçamento público e visibilidade, era só admirado com suspeita há 20 e muitos anos, pois a nossa racionalidade e tendência para o preconceito fazia a narrativa perfeita para que entendêssemos o fenómeno. Com luz, água canalizada, esgotos, telefones, todos os serviço à mão de semear cá em baixo, na vila, só poderiam ser loucos os que se isolavam no meio da Serra, onde tudo seria mais difícil e trabalhoso. Só compreendíamos as migrações para locais mais ricos, mais desenvolvidos, nunca o fenómeno contrário. No livro do mês a narradora vive dilemas e uma realidade dura no papel de forasteira no local onde vive, o que nos faz meditar nas dificuldades e sofrimento de uma pessoa deslocada da sua família, da sua terra, que enfrenta o desconhecido. Um tema tão atual e cada vez mais instrumentalizado pelas forças políticas que o enaltecem ou diabolizam, conforme o que lhes dá mais proveito, e no meio, eles, os forasteiros: imigrantes, refugiados de guerra, todos debaixo de um mesmo holofote, mas que dependendo da posição de onde ilumina, transforma pessoas em sombras, mais ou menos visíveis. Tenhamos por isso uma visão menos iluminada artificialmente e olhemos estes "forasteiros" à luz do dia, olhos nos olhos, ouçamos as suas histórias, diretamente e não pelos vídeos e propagandas, quando o assunto são Humanos. É o mínimo, e que para a personagem principal do nosso livro teria feito toda a diferença.

Durante o mês de Junho propomos a leitura do novo livro da Luísa Sobral, pois estamos muito curiosas com esta obra: "Nem todas as árvores morrem de pé"



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